11 de maio de 2012

Grand Finalle

Grand Finalle

Era uma vez, uma adolescente, morava com sua pequena família em sua humilde casa. Que bela, que linda era ela, cabelos longos, sua pele não continha a menor ruga. Mas como toda flor à desabrochar, ela estava cansada da mesmice do cotidiano, e como toda princesa, regava a mais profunda fantasia de se apaixonar por um príncipe encantado descido dos céus. Parte se realizara em uma bela tarde de verão, quando um circo itinerante passou por lá.

Esperava o ônibus na estrada (pois afinal, morava relativamente longe da cidade onde estudava) quando viu uma lona estendida do outro lado. “Que tolice, perder o tempo rindo de piadas tolas e brincadeiras bobas” pensou ela, mas o ônibus se demorara daquela vez, e, já que não tinha mais nada para fazer naquele lugar perdido, resolveu adentrar a enorme cabana. “Aproximem-se, aproximem-se” berrava aquele que se imaginava como um rei naquele lugar, convidando seus súditos a entrar. Ela odiava aquele tipo de gente, aquela arrogância, e o que mais doía era que enxergava aquilo nela mesma. Se sentou em uma das fileiras mais altas, e assistiu palhaços, malabaristas, leões e todos aqueles artistas inglórios tentarem e falharem em seu atento de divertir o público.

Até que o verdadeiro espetáculo chegou. Uma cortina cobria uma grade que dentro dela, aprisionava a verdadeira atração, um homem com asas de corvo, um anjo de asas negras. Seu confinamento entrou na enorme tenda onde seria mostrado como aberração, forma com que ele era visto por toda a sociedade, pelo menos até aquele momento. Quando a cortina se abriu, ela sentiu que seu coração logo pararia, e não era por causa de suas asas. “Que lindo, que extraordinário” pensara,  palavras simples, as únicas que chegavam mais perto de expressar o que sentira por ele. Ele esperava cabisbaixo de joelhos no chão sujo de sua jaula então lentamente levantou seu belo rosto e por um milésimo de segundo, olhou fundo nos olhos de sua admiradora. Levantou a cara um pouco mais, e saltou, as portinholas que impediam que chovesse em suas asas (“Pois afinal, asas molhadas não voam” pensava seu carrasco, e este era o único real motivo de preocupação em mante-lo seco) se abriram, e ele voou. Suas asas eram tão grandes e tão negras quanto o céu noturno. Seu peito nu era branco como a lua (e tão brilhoso quanto) e possuía uma aura indescritível. Quando já estava quase saindo do toldo, suas asas pararam de repente, então ele mergulhou no ar, e quando estava a poucos metros do chão, mudou de direção, e continuou bailando no ar, descrevendo círculos e mais círculos, como se fossem alianças para o casamento de dois deuses.

Acabou tudo num piscar. Ela estava, pela primeira vez em muito tempo, sem absolutamente nenhuma palavra. O miserável déspota chamara seus leais servos para limpar a bagunça. Naturalmente todos haviam saído, mas ela continuava lá, observando quem seu rebelde coração insistia em chamar de amor. Até que ele a viu, e a ela se dirigiu. A admiradora olhara fundo em seus olhos, e quase se afogara neles, pois eram tão profundos quanto o mar e negros como a noite.
- Lady, terei de pedir que saia, pois o espetáculo acabou - pedira o Corvo, embora seu coração rogasse o contrário.
- Eu, eu... - começara ela, mas então, tragicamente foi bruscamente interrompida por uma voz primitiva, animal assim como a função que o dono da voz desempenhara.
- Perdoe-me mocinha, às vezes é difícil controlar feras como ele.
E então a besta (pois mesmo em meus vasto vocabulário até hoje não encontrei palavra melhor para descreve-lo) chicoteou as costas do amante, deixando uma longa cicatriz vermelha. Doeu tanto na pele dele quanto no coração dela. Afinal, como alguém como ele, que a seus olhos era obviamente muito melhor que um comediante qualquer, se deixava ser tão mal-tratado? Ele se virou, acostumado com o tratamento, e estava voltando para sua cela, para o que a sociedade o obrigara a chamar de lar. Indignada, injustiçada, logo se atreveu a dizer algumas poucas palavras que transbordavam de significado.
- Não se vá, por favor, eu lhe rogo, não há por que obedecê-lo.

“Cale a boca, garota tola” ordenou o miserável. Mas as doces palavras que a garota dissera tiveram o impacto que desejara. O corpo daquele que por tanto havia sido domado, acorrentado, se enrijeceu, e então as verdadeiras correntes que o impediam de fugir se quebraram, ele estava livre agora que finalmente alguém além de um velho falido o queria por perto. O chicote já estava saltando para suas costas, quando num piscar de olhos, ele o agarrou e com serenidade falou: “Não, não mais serei seu escravo, não mais me prenderei a este lugar, não mais serei seu ganha-pão”. Essas palavras atingiram o pobre diabo como duras maldições, simples palavras que arruinaram a vida daquele velho tirano que perdera a coroa. E então, arrancou o chicote de sua mão e o jogou para o alto.

E então, olhou nos lagos cristalinos que eram os olhos de sua musa, e com um simples olhar, recitou como lindas notas todas as palavras que queria dizer, mas não poupou seus lábios de todo o esforço. E estendendo sua mão disse “Por favor, só me conceda mais uma benção, minha linda princesa. Aceite um lugar ao meu lado na imensidão que se estende além deste mundo”. E com seus olhos claros focados nos dele, ela o beijou. Suas asas então não mais negras, mas sim brancas como as nuvens, se esticaram, e eles voaram livres pelo sempre.

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